A importância histórica do Liberalismo Clássico para o regime democrático ocidental
Quem nunca ouviu que o “Liberalismo só pensa nos mais ricos, visa aumentar as desigualdades e não pensa no bem comum”? Esse pensamento é comum, mas está tremendamente incorreto. A história nos comprova a relação entre as teses liberais e a consolidação da democracia representativa, instituições independentes e Estado eficiente.
A corrente denominada Liberalismo foi formulada a partir dos séculos XVII e XVIII, na Idade Moderna, após o período conhecido como Idade Média. Nessa época, surgiram autores, políticos e pensadores que questionaram a composição do poder vigente: um governante absoluto que possuía privilégios, o monopólio da força e da justiça. Logo, era um sistema injusto com a classe comum.
Nesse sentido, Montesquieu, John Locke e John Stuart Mill fundamentaram teses liberais que até hoje influenciam o mundo ocidental. Todos eles apontaram o regime democrático como o mais eficiente para o funcionamento da ordem social e institucional, bem como pregavam a expansão dos direitos cívicos e a necessidade de existirem Órgãos e Poderes independentes, mas fiscalizadores entre si.
Sobre este tópico, Montesquieu escreveu que (1985, p. 61): “o amor pela república, numa democracia, é o amor pela democracia; o amor pela democracia é o amor pela igualdade”. Logo, se obtém que os liberais clássicos, por viverem no Absolutismo e num Estado sem justiça imparcial e sem direitos positivados, entendiam a necessidade de uma mudança no modelo de sociedade a ser atingido.
O que esses liberais pensavam era na diminuição da concentração de poder nas mãos de um só monarca (não eleito pelo povo) e a garantia de direitos naturais a todo cidadão, sendo os direitos à Vida, Liberdade e Propriedade. Assim, o único modo de se atingir a igualdade perante a lei seria por meio de um sistema de freios e contrapesos do poder e um robusto arcabouço jurídico, escrito ou não, chamado de Constituição, sendo esta a base dos Estados Democráticos de Direito atuais.
Além disso, entendiam que o novo Estado precisava atuar em áreas tidas como essenciais para a conjuntura social, como saúde, educação e justiça, garantindo-se um mínimo de vida digna para a população (que futuramente chamaríamos de dignidade da pessoa humana). Portanto, a ideia de Estado eficiente já existia muito antes de ser efetivamente aplicada nos séculos seguintes às grandes Revoluções Liberais.
Nesse sentido, destaca-se a influência destas revoluções, sendo a francesa, inglesa e americana. Elas balizaram o reconhecimento e, principalmente, a positivação dos direitos cívicos. Foi a partir desse período histórico que os Direitos Naturais foram, de fato, implementados no mundo ocidental e definidos como Direitos de Primeira Geração, sendo englobados nas normas jurídicas das nações.
Para fins de maiores esclarecimentos, é sempre necessário enfatizar que, apesar deste texto elogiar os avanços trazidos pelo Liberalismo clássico ao redor do mundo, esta corrente de pensamento deve ser analisada em face do contexto em que se encontrava, para não haver anacronismo; por isso, não é possível querer se aplicar integralmente as ideias dos liberais antigos contemporaneamente, seja pelas mudanças sociais ocorridas ou problemas anteriormente não presentes nas sociedades daquela época. Isso vale para qualquer movimento político-econômico.
Isso entendido, é inegável os avanços que estes liberais trouxeram para nossa realidade. E, para corrigir e adaptar algumas de suas ideias, futuros liberais vieram e reformularam o próprio Liberalismo, adaptando-o para as exigências dos “novos tempos”, como voto feminino, ascensão de regimes totalitários e novas crises econômicas. Portanto, como toda corrente ideológica, ele se atualizou.
Em solo nacional, tivemos figuras liberais do século XIX, como Joaquim Nabuco e Luiz Gama, que defenderam o Abolicionismo – o próprio Gama era negro ex escravo-, bem como a abertura econômica e o livre exercício da imprensa, por exemplo.
Dessa maneira, os liberais atuais devem resgatar alguns valores do passado, a fim de refletirem sobre o que funcionou, como e porquê e adaptar aspectos que não evoluíram corretamente, para poderem implantar um sistema liberal democrático que funcione no Brasil contemporâneo.
Apenas com teses sólidas, diálogo com pensamentos diferentes e crítica construtiva ao que “veio antes” é que far-se-á possível uma nova onda liberal.
Autor: Matheus Rocha de Almeida Ataide
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ACADEMIA BRASILEIRA DE LETRAS. Joaquim Nabuco – Biografia. Acesso em 24 de fevereiro de 2023. Disponível em: https://www.academia.org.br/academicos/joaquim-nabuco
MONTESQUIEU. Do Espírito das Leis. Trad. Fernando Henrique Cardoso e Leôncio Martins Rodrigues. 2. ed. São Paulo: Abril Cultural, 1985.
PAIM, Antonio. Evolução Histórica do Liberalismo. LVM Editora: 2019PAIM, Antonio. História do Liberalismo Brasileiro. 2° Edição – São Paulo: 2018.